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sábado, 4 de janeiro de 2014

Lance Antigo.


Os heróis do antigo futebol
Augusto Frederico Schmidt

   Depois de terem entrado em campo, na tarde de  20 do corrente, os jogadores da equipe que iam disputa a última partida do campeonato de 1953- o Flamengo e o Botafogo - teve lugar uma cerimônia tocante, promovida pelo Correio da Manhã.
   O pretexto era a  apresentação dos uniformes com que vão peleja, no próximo campeonato mundial, a realizar-se na Suíça, os elementos do nosso selecionado:  um helicóptero aterrissou, em pleno Maracanã, trazendo a bordo um cadete da Escola Milita das Agulhas Negras, comissionado por seus companheiros para entregar a bandeira do Brasil aos nossos desportistas em excursão à  Europa. Tornara-se festa cívica, havia uma banda milita executando dobrados, o povo estava excitado, a torcida mengo tornara-se extraordinariamente quente e ritmava os seus aplausos e grito de entusiasmo.  De repente o rádio  anunciou uma grande surpresa: esse  jornal tivera a ideia de  convocar ao jogadores do campeonato  sul-Americano de 1919, os velhos leões do  futebol brasileiro. Sete compareceram, atendendo ao chamado. E um por um, anunciados pelo alto-falante, foram entrando no nosso gramado.
   Eram algumas figuras inesquecíveis do nosso esporte. Vi, então, Marcos Carneiro de Mendonça, o outrora glorioso goleiro do Fluminense, alto, conservado apesar da idade, o porte varonil e a inalterável elegância, chegar, o primeiro, debaixo de aplausos. Em seguida, outros nomes foram anunciados- Píndaro, zagueiro do Flamengo e companheiro de Néri; os grandes paulistas campeões, Neco, Heitor, Amílcar, Fredenrich, Arnaldo, Bianco...
  Quatro campeões deixaram de comparecer. Por quê? Fortes não quis, certamente, vir; era um medico extraordinariamente ágil, meio moleque em campo, sempre brincando; creio que não veio só por vaidade, pois sempre o encontro na Rua Quitanda, do quarteirão do Café.
   o estádio do Maracanã estava cheio, mas eram moços quase todos assistentes.
   Gente da minha idade, talvez uns dez por cento. Os nomes que iam sendo mencionados ao microfone significavam, para a grande maioria dos que ali estavam, nomes históricos do futebol nacional, lidos algumas vezes em jornais, personagens da evocação de Mário Filho - este, meu conhecido desde menino de Copacabana, e hoje muito avô. eram, sim, figuras históricas, quase fundadoras do futebol em nossa terra, nossos primeiros jogadores de classe, gloriosos nomes que aquela multidão excitada conhecia por tradição. Pra mim, entretanto, eram figuras bem vividas, heróis de minha meninice ressurgindo! Quando os vi aparecer, já todos eles com mais de cinquenta anos, alguns como cabelos brancos, senti ressoar em minha lembrança os gritos, os ruídos, os aplausos dos dias longínquos de trinta e cinco anos atrás, quando o association era jogado por amadores. Ali estavam os veteranos, mas, vendo-os e sonhando, cuidei que tornava a uma outra vida: Marcos Píndaro, Amílcar, Friendenreich, Arnaldo, Bianco, Heitor e o velho Neco... admiráveis todos, recuperavam subitamente o jeito perdido de correr e atuar. Espremido, o rosto colado á tela de arame que isolava o antigo campo Fluminense, eis que me reencontro a mim próprio, aos meus treze anos de idade: a partida final contra os argentinos (terá sido mesmo contra os argentinos?) prorrogara-se além do tempo normal, por este combinado que não haveria empate... e de repente Friendenreich atira ao gol, marcando a vitória e acendendo a grande emoção, de caráter nitidamente patriótico - o triunfo do Brasil era o que importava, acima de tudo!


                                               (O Galo Branco, páginas de memórias - Rio, 1957)

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